A moça da vitrine

Quanto valem o show e as palavras de Lorena?

Mal saiu do recinto soturno onde nos encontrávamos (“a sala da administração”, nas palavras do bigodinho), a mulata subiu alguns lances de escadas até alcançar o pavimento em que 16 cabines enfileiradas, todas minúsculas, compõem um semicírculo. Fui atrás – e finalmente pude vê-la em trajes profissionais: uma lingerie vermelha quase microscópica, meias sete oitavos rendadas, um scarpin dourado e dois piercings atravessando-lhe o umbigo.
No subsolo, no térreo e no primeiro andar do antigo edifício, ironicamente vizinho de uma igreja católica, funciona o Miami, único peep show do Rio de Janeiro e talvez do país. O nome em inglês é autoexplicativo. Peep significa olhadela. Trata-se, portanto, de um estabelecimento destinado às práticas ancestrais do voyeurismo e da masturbação. Entre segunda e sexta-feira, das 11h30 às 21h20, Lorena e mais 14 mulheres (Lili, Manu, Sheila, Tayná…) fazem strip-tease diante de homens que se acomodam nas 16 cabines privativas. Doze contam com uma janela envidraçada, de onde se avista um mesmo palquinho giratório. Em cada um dos outros quatro cubículos, a janela dá para uma vitrine exclusiva. Fechado nas cabines, o cavalheiro não consegue tocar as damas. Mas pode espiá-las e ouvi-las à medida que dançam, acariciam-se e tiram as diminutas roupas em cima do palquinho ou dentro das vitrines. Quanto mais o voyeur desembolsar, por mais tempo apreciará as coreografias sinuosas e, não raro, desajeitadas. Um minuto divisando o palquinho custa R$ 1,50. Vinte minutos em frente às vitrines consomem R$ 75,00 – justamente o que topei gastar para prosseguir o papo com Lorena.
A niteroiense de 33 anos é stripper desde fevereiro de 2009 e mora numa favela não pacificada da zona norte carioca, a Furquim Mendes. Nunca cogitara se despir em público antes de o Miami a contratar. Quando tomou conhecimento do peep show, vendia artigos de natação no Shopping Leblon e estudava pedagogia à noite. Passava o dia inteiro de pé. Preferiu abandonar a faculdade e aceitar o novo emprego não apenas porque ganharia melhor (com registro em carteira como bailarina), mas igualmente pela possibilidade de descansar, “sentadinha da silva”, entre uma exibição e outra. De início, mal encarava os espectadores, morta de vergonha. Caso notasse que iriam se masturbar, virava de costas. Hoje, bem mais solta, presta atenção em todos os gestos masculinos e diz que, na maioria das vezes, não se sente constrangida nem explorada. Pelo contrário: diverte-se muito. “Vejo cada coisa…” Certa ocasião, um marmanjo livrou-se do terno durante a performance dela, revelando trajar calcinha e sutiã. A stripper manteve a fleuma, e o crossdresser acabou por lhe ofertar as peças íntimas.
O trecho pago de nossa conversa ocorreu numa das cabines, com Lorena seminua. Inevitável constatar que a jovem de 1m74 estava gordinha. “Estou mesmo. Peso agora 76 quilos. É que os clientes gostam assim – e meu marido também…” Ele, um mototaxista, só engoliu a profissão da mulher após reclamar bastante e sob duas condições: a parceira não pode lhe contar nada do que vivencia ao longo do expediente e deve testar no quarto do casal as lingeries que usará em cena.
(revista VIP)

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