“A ideia de celebridade agencia uma diferenciação num mundo que se deseja construído de iguais. Os seus perigos são claros: toda pessoa célebre tem uma superespecialização que se confunde com um dom. O famoso é a tela na qual as pessoas comuns projetam o que lhes falta. Os mitos das celebridades insistem em dizer como elas foram pessoas simples e pobres antes de obterem a tão desejada fama. O astro é, entre outras coisas, um especialista no que faz e um modelo do que faz. Daí a tendência a confundir o seu papel público com a sua intimidade. A suposição de uma excepcionalidade em tudo se desfaz e decepciona quando ocorre um desvio entre a figura que aparece no palco e a figura que surge — bêbado, burro, arrogante, desonesto, corrupto e, acima de tudo, infeliz como todo mundo — na vida real. Isso é acentuado pela nossa busca de coerência. Do outro lado do universo das celebrizações para cima, há o conjunto de empregados e de inferiores que congrega as ‘celebridades para baixo’. Os garçons, engraxates, motoristas, porteiros e empregados em geral que fazem a nossa comida, lavam a nossa roupa, vigiam nosso lar e nos protegem do mundo. Esses fornecedores de amor, atenção e carinho preenchem um espaço que não ocupamos e passam a impressão de que vivem apenas para o que fazem. Para muitos, ver a empregada namorando é tão surpreendente quanto descobrir que a sua celebridade favorita tem um péssimo caráter.”