Quanto vale um poema?

“Durante os breves dias que passei agora no Brasil, pasmei com a ferocidade da campanha contra um projeto de poesia de Maria Bethânia. O meu pasmo foi subindo de degrau em degrau a cada hora de cada um dos cinco dias e terminou num miradouro de indignação. Parece-me útil dar a ver aos brasileiros o panorama feio que os meus portugueses olhos divisaram _amo demasiado o Brasil para poder ficar fora dele mesmo quando ele me deixa fora de mim. (…) O coro de virgens ofendidas com a verba que o Ministério da Cultura autoriza a captar para o projeto da cantora ( R$ 1,3 milhão) é patético por diversas razões, a primeira das quais é a suposição cândida de que, a não ser investido na divulgação de poesia de língua portuguesa a que Bethânia se propõe, esse dinheiro seria canalizado para escolas, hospitais e o escambau. (…)
A 8 de março de 2010,  Bethânia falou-me da sua vontade de levar pelo interior do Brasil e de Portugal um conjunto de espetáculos exclusivamente dedicados à poesia. Que Bethânia ou alguém próximo dela (porque Bethânia nem sequer é praticante da religião das redes virtuais) tenha acrescentado a esse projeto a circulação dos poemas ditos na internet, parece-me uma excelente e eficaz ideia. Sim, opulentos invejosos, já há muita poesia na net _mas não dita e encenada por Bethânia. A voz e o critério dela chegam mais longe, movem mais almas_ é isso que não se lhe perdoa. Caetano já o disse, numa crónica coruscante, no Globo. Mas eu quero repeti-lo, porque não sou irmã dela _amo-a, sim, como comecei a amá-lo a ele, desde a mais tenra juventude e sem os conhecer de parte alguma nem saber onde ficava Santo Amaro da Purificação, de onde ambos vieram, sem patrocínios nem padrinhos, para acrescentar luz e força às nossas vidas. Amo-os porque as suas vozes e os seus dons criativos me fizeram e fazem acreditar que o mundo pode ser um lugar mais belo e mais sábio. O Brasil está a dar certo porque eles _e muitos outros como eles, e uma multidão com eles_ assim o quiseram. E isso só não vê quem não quer _ou não é capaz_ de ver.”

Trecho do artigo Bethânia e as Virgens Ofendidas, da romancista portuguesa Inês Pedrosa

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