Pai, afasta de nós esse cale-se

“Fico constrangido em dizer que achei as declarações suas e da Paula Lavigne, exigindo censura prévia de biografias, escandalosas, indignas de uma pessoa que tanto tem dado para a cultura. Para o bem dessa cultura, preciso dizer por quê. Primeiro, achei esquisitíssimo músicos dizerem que biógrafos querem ficar com ‘fortunas’. Caetano, como dizem no Brasil: fala sério. Ofereço o meu exemplo. A biografia de Clarice ficou nas listas de mais vendidos em todo o Brasil. Mas, para chegar lá, o que foi preciso? Andei por cinco anos pela Ucrânia, pela Europa, pelos EUA, pesquisando nos arquivos e fazendo 257 entrevistas. Comprei centenas de livros. Visitei o Brasil 12 vezes. Você acha que fiquei rico, depois de cinco anos de tais despesas? Faça o cálculo. A única coisa que ganhei foi a satisfação de ver o meu trabalho ajudar a pôr Clarice Lispector no lugar que merece. (…)
Não é questão de dinheiro, Caetano. A questão é: que tipo de país você quer deixar para os seus filhos? A liberdade de expressão não existe para proteger elogios. Disso, todo mundo gosta. A diferença entre o jornalismo e a propaganda é que o jornalismo é crítico. Não existe só para difundir as opiniões dos mais poderosos. E essa liberdade ou é absoluta, ou não existe. Imagino, e compreendo, que você pense que está defendendo o direito dos artistas à vida privada. Mas quem vai julgar quem é artista, o que é vida privada e sobre quem ou o que se pode escrever? Você escreve em jornal. Como o artista deve fazer, tem se metido no debate público. Sarney, da Academia Brasileira de Letras, escreve romances. Deve ser interditada também qualquer obra crítica sobre ele, sem autorização prévia?”

Trecho da Carta Aberta a Caetano, escrita pelo norte-americano Benjamin Moser, autor de Clarice 

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