O que os move?

Uma das muitas cenas de violência policial que presenciamos durante as manifestações
O autor da foto é Rodrigo Paiva

Acabo de retornar dos protestos na região central de São Paulo. Fui somente como observador, com dois objetivos: saber quem são os ativistas e tentar descobrir de que maneira começam os atos de violência. O que vi e ouvi:
1. Milhares de jovens se concentravam pacificamente na praça Roosevelt quando, sem nenhum motivo aparente, a polícia iniciou um intenso bombardeio. Bombas de gás lacrimogênio explodiam sem parar, produzindo estrondos muito altos e assustadores. Nunca presenciei nada parecido no centro da cidade. Os ativistas, pelo menos naquele momento, não reagiram. Muitos apenas gritavam: “Sem violência, sem violência!” Mesmo assim, a artilharia prosseguiu. O ar se tornou irrespirável e os manifestantes começaram a se dispersar.
2. Corri em direção à rua Rego Freitas, onde recebi máscaras cirúrgicas, distribuídas por moças e rapazes que se encontravam diante do coletivo Matilha Cultural. Eles nos convidavam a entrar. Ali, as máscaras eram encharcadas com vinagre, substância que corta o efeito do gás lacrimogênio.
3. Quando retornei à rua, havia sacos de lixos pegando fogo e algumas caçambas tombadas _tudo no meio da via, para impedir o avanço da tropa de choque. Rumei em direção à rua da Consolação. Mal cheguei ali, na altura do Mackenzie, avistei uma quantidade grande de policiais motorizados, que ocupava toda a pista sentido bairro. Naquele ponto, um ônibus pichado fora abandonado, mas já não ocorria nenhuma manifestação. Dispersos, os ativistas se misturavam à população que não se engajara no movimento. Caminhei alguns metros pela calçada quando me deparei com um cordão policial bastante hermético, que bloqueava a rua. Mais adiante, bombas explodiam, sem que eu pudesse ver o que estava acontecendo. O ar começou a ficar novamente irrespirável. Um dos soldados se dirigiu a nós, que simplesmente caminhávamos, apontou uma arma com balas de borracha para o chão e gritou: “Dispersar, dispersar!” Começou a atirar. Todo mundo correu, lógico.
4. Impedido de prosseguir pela Consolação, decidi pegar o metrô na estação Santa Cecília. Andei até lá. Ao longo do caminho, muitos jovens conversavam em pequenos grupos, sem nenhum policial por perto. Mal entrei na estação, dei de cara com uma fila imensa. Eram centenas e centenas de passageiros que tentavam cruzar as catracas. Como as ruas das redondezas estavam bloqueadas, só lhes restava pegar o metrô. Fiz um cálculo rápido e concluí que levaria muito tempo para conseguir embarcar. Resolvi andar até a avenida Pacaembu, onde acabei tomando um táxi.
5. Quanto aos manifestantes: os que vi são, na maioria, bem jovens _talvez tenham entre 18 e 25 anos. Aparentavam pertencer à classe média e morar longe das periferias (ATENÇÃO: não há, nessa observação, nenhum juízo de valor). Intrigaram-me especialmente a coragem e a convicção com que encaravam a reação da polícia. Algo de muito forte e genuíno parece movê-los, para além da reivindicação em torno do transporte público. Ainda não compreendi direito o que é.

Filmado pela amiga Denise Yui

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