É possível alcançar a unidade na diversidade?

“O filósofo Alain Badiou nos lembra como a sociabilidade contemporânea parece fascinada pelo ‘amor seguro contra todos os riscos’. Dos sites de relacionamento que prometem encontros sob medida à implementação terapêutica da lógica mercantil que mede relações a partir de custos e benefícios, encontraríamos sempre o mesmo ‘amor securitário’ cada vez mais hegemônico em nossas sociedades liberais. Algo como ‘um arranjo prévio que evita todo acaso, todo encontro e finalmente toda poesia existencial, isto em nome da ausência de risco’. Pois um sujeito que age politicamente a partir do medo e do desejo de segurança tende a reconfigurar até suas relações sociais mais privadas a partir dos mesmos afetos. Ele tende a ver, nas relações amorosas, uma forma de contrato que visa a ‘otimizar’ os sistemas de interesses de duas pessoas privadas. (…)
[Essa posição evidencia] uma recusa fundamental. A recusa em compreender o amor como uma ‘construção de verdade’. Tal expressão é feliz por inicialmente afirmar que há um regime de verdade que se revela no interior de relações amorosas: ‘verdade a respeito de um ponto bastante peculiar, a saber, o que é o mundo quando ele é experimentado a partir do dois, e não do um? O que é o mundo examinado, praticado e vivido a partir da diferença, e não a partir da identidade?’. Nessa recuperação filosófica do amor, ele retorna como modelo de uma vivência da diferença capaz de construir mundos a partir de pontos de vista descentrados.
Tal descentramento significa que, nas relações amorosas, os sujeitos não procuram apenas a conformação do outro a um conjunto de expectativas e imagens fantasmáticas prévias. Eles procuram, mesmo sem saber, esse ponto onde o outro resiste a sua submissão pelo pensamento identitário do Eu. Ponto no qual o outro é capaz de dizer: “Você não vai me dobrar”, não como alguém que impõe uma recusa, mas como alguém que instaura um amor capaz de nos levar a uma região rara onde encontramos coisas desprovidas de gramática, onde precisamos aprender a amar coisas desprovidas de gramática.”

Trecho do artigo Alain Badiou discute o papel político e social do amor, de Vladimir Safatle

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