Os sons do banal

O homem de 43 anos que mora sozinho num apartamento de dois quartos sempre julgou ter o silêncio como única _e agradável_ companhia. Entretanto, certa manhã, percebe-se mergulhado em ruídos: a descarga do banheiro, o girar das torneiras, a ducha sobre o piso azul, o ir e vir da escova de dentes, os pés descalços rasgando o chão de madeira, o teclado do computador, a caneta que desbrava o bloquinho de anotações, o abrir e fechar de portas, o murmúrio da geladeira, o farfalhar das persianas, o bater de talheres, o roçar da camisa no pescoço, a cantoria do molho de chaves, a esponja que lambe o prato sujo, o grito do telefone, o aparelho descartável de barbear varrendo o rosto magro. Por que não os notava antes?

Inspirado em H., relato memorialístico do poeta Carlito Azevedo

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