segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Fita métrica

“‘Quem é o maior poeta, o Carlos Drummond ou eu?’, passou a perguntar João Cabral de Melo Neto, sempre que se sentia mais à vontade diante do seu interlocutor. Pouco à vontade ficava neste caso o interlocutor. Interpelado um dia nestes termos por João Cabral, o escritor Antonio Carlos Villaça teve que sair com um ‘Não, não é bem assim, na verdade vocês dois não são homens altos…’”

Trecho de Os Sapatos de Orfeu, biografia de Carlos Drummond de Andrade escrita por José Maria Cançado  

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Nenhuma cidade do país reúne céu e inferno como o Rio de Janeiro?


Foto de Urbano Erbiste
O título do post se inspira em um artigo da atriz Fernanda Torres:
No Rio, as contradições sociais são infinitas
(clique na imagem para ampliá-la)

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Prazer em desconhecê-lo

“A perversidade é o único desporto que pratico. Com regularidade. Um exemplo: alguém me apresenta uma celebridade, dessas que são conhecidas por serem conhecidas, e eu finjo que nunca ouvi falar. ‘Como é mesmo o seu nome?’ O personagem em causa repete o nome, como se tivesse escutado uma heresia. O rosto não mente: a estupefação profunda; o naufrágio iminente; por vezes, a revolta silenciosa, dolorosa; mas, em todos os casos, uma velha insegurança, que vem das profundezas da alma. Às vezes, quando estou em forma, subo a parada. A pessoa repete o nome. E eu, propositadamente, troco a profissão. Se é um cantor, digo que já o vi numa novela. Se é um ator, confundo com um cantor. É o golpe final na vaidade da criatura. A minha perversidade não é um traço de caráter. De mau-caráter. É, quando muito, uma experiência sociológica: as pessoas podem ter todos os aplausos do mundo; podem ter legiões de assessores, adoradores e puros escravos; mas se não existe uma personalidade segura e forte por detrás da máscara, qualquer pequena pedra na engrenagem faz tremer e descarrilar a máquina. Eu sou a pequena pedra.”

Trecho do artigo Ligados à máquina, de João Pereira Coutinho

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Viver

Não nos ensinam a nadar nem nos oferecem uma boia. Apenas nos metem nesta barca furada e… virem-se! O que nos resta então? Tornar o naufrágio minimamente divertido.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Tanquinho

Cartum de Rafael Corrêa

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

O outro ainda sou eu?

Vejo o outro e, de repente, me toco que só posso reconhecê-lo com meus olhos, meus sentimentos, minhas verdades. Do lugar onde me encontro, o outro se concretiza apenas quando me invade e ocupa em mim uma porção que, embora dele, nunca me ultrapassará.

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Acerto final

– O que você quer, senhor Antenore, a inocência? O senhor quer a inocência de volta?, o funcionário do Paraíso me dirá, com a minha ficha suja na mão, todo aquele passado irrecuperável enumerado em itens, um desastre depois do outro; O senhor quer a inocência numa bandeja de ouro à sua disposição, aqui no Céu?

A partir do romance Um Erro Emocional, de Cristovão Tezza 

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Intruso

“Faça-me um favor? Retire-se do meu personagem!”

De Eça de Queirós para alguém que, equivocadamente, se julgava retratado pelo romancista

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Já pensou como devia ser dura a vida dos desmancha-prazeres na Grécia antiga?

Cartum de Arnaldo Branco

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Prendam o mocinho

“O tráfico que ora perde poder e capacidade de reprodução só se impôs, no Rio, no modelo territorializado e sedentário em que se estabeleceu, porque sempre contou com a sociedade da polícia, vale reiterar. Quando o tráfico de drogas no modelo territorializado atinge seu ponto histórico de inflexão e começa, gradualmente, a bater em retirada, seus sócios – as bandas podres das polícias – prosseguem fortes, firmes, empreendedores, politicamente ambiciosos, economicamente vorazes, prontos a fixar as bandeiras milicianas de sua hegemonia.
   Discutindo a crise, a mídia reproduz o mito da polaridade polícia versus tráfico, perdendo o foco, ignorando o decisivo: como, quem, em que termos e por que meios se fará a reforma radical das polícias, no Rio, para que estas deixem de ser incubadoras de milícias, máfias, tráfico de armas e drogas, crime violento, brutalidade, corrupção? Como se refundarão as instituições policiais para que os bons profissionais sejam, afinal, valorizados e qualificados? Como serão transformadas as polícias, para que deixem de ser reativas, ingovernáveis, ineficientes na prevenção e na investigação?
   As polícias são instituições absolutamente fundamentais para o Estado democrático de direito. Cumpre-lhes garantir, na prática, os direitos e as liberdades estipulados na Constituição. Sobretudo, cumpre-lhes proteger a vida e a estabilidade das expectativas positivas relativamente à sociabilidade cooperativa e à vigência da legalidade e da justiça. A despeito de sua importância, essas instituições não foram alcançadas em profundidade pelo processo de transição democrática, nem se modernizaram, adaptando-se às exigências da complexa sociedade brasileira contemporânea. O modelo policial foi herdado da ditadura. Ele servia à defesa do Estado autoritário e era funcional ao contexto marcado pelo arbítrio. Não serve à defesa da cidadania. A estrutura organizacional de ambas as polícias impede a gestão racional e a integração, tornando o controle impraticável e a avaliação, seguida por um monitoramento corretivo, inviável. Ineptas para identificar erros, as polícias condenam-se a repeti-los. Elas são rígidas onde teriam de ser plásticas, flexíveis e descentralizadas; e são frouxas e anárquicas, onde deveriam ser rigorosas. (…)
   Uma das fontes da degradação institucional das polícias é o que denomino ‘gato orçamentário’, esse casamento perverso entre o Estado e a ilegalidade: para evitar o colapso do orçamento público na área de segurança, as autoridades toleram o bico dos policiais em segurança privada. Ao fazê-lo, deixam de fiscalizar dinâmicas benignas (em termos, pois sempre há graves problemas daí decorrentes), nas quais policiais honestos apenas buscam sobreviver dignamente, apesar da ilegalidade de seu segundo emprego, mas também dinâmicas malignas: aquelas em que policiais corruptos provocam a insegurança para vender segurança; unem-se como pistoleiros a soldo em grupos de extermínio; e, no limite, organizam-se como máfias ou milícias, dominando pelo terror populações e territórios. Ou se resolve esse gargalo (pagando o suficiente e banindo a segurança informal e ilegal; ou legalizando e disciplinando, e fiscalizando o bico), ou não faz sentido buscar aprimorar as polícias.
   O Jornal Nacional, neste 25 de novembro, definiu o caos no Rio de Janeiro, salpicado de cenas de guerra e morte, pânico e desespero, como um dia histórico de vitória: o dia em que as polícias ocuparam a Vila Cruzeiro. Ou eu sofri um súbito apagão mental e me tornei um idiota contumaz e incorrigível ou os editores do JN sentiram-se autorizados a tratar milhões de telespectadores como contumazes e incorrigíveis idiotas.”

Trecho do artigo A crise no Rio e o pastiche midiático, do cientista político Luiz Eduardo Soares
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