Vale a pena anular o voto?

“Agora já sabemos o final da história. O filme iniciado em 6 de junho de 2013 terminou no dia 5 de outubro, com a eleição do novo Congresso. Tudo começou quando nosso herói, o jovem idealista cheio de boas intenções, foi para a rua enfrentar o velho político responsável ‘por tudo que aí está’. O público esperava ansioso por um final feliz, com a derrota do vilão. Deu tudo errado. A bancada de deputados conservadores aumentou muito: segundo cálculos do Diap, desde o fim da ditadura não se via Congresso tão reacionário. (…) Quer dizer, então, que manifestações libertárias reforçam o conservadorismo? Depende. Protestos ‘contra um’ em geral são mais eficazes que protestos ‘contra todos’: o ‘Caracazo’ na Venezuela (1989) e o ‘Cacerolazo’ na Argentina (2001) levaram ao impeachment de Carlos Andrés Pérez e à renúncia de Fernando de la Rúa. Quem tem uma meta sabe o que precisa fazer. As jornadas de 2013 tinham, a princípio, uma só bandeira: anular o aumento nas tarifas de transporte – daí seu êxito inicial. Mas, tão logo a demanda foi satisfeita, os jovens sacaram das redes sociais uma pauta desconexa: contra a Copa, a PEC 37, a homofobia, a corrupção… (…) Impregnados por esse moralismo anarquista, os manifestantes hostilizavam os ativistas de esquerda, que aceitaram a realidade prosaica do jogo democrático – as doações eleitorais, os acordos partidários, a gestão do Estado. (…) Enquanto os libertários ‘ameaçavam’ o poder com o voto nulo, uma massa silenciosa aguardava sua vez de entrar em cena – para votar no policial que reprimia os baderneiros, no pastor que ofendia os homossexuais, no ruralista que atacava os comunistas. Nossos reacionários não fazem poeira: fazem política. Eles sabem que os manifestantes passam, mas os deputados ficam.”

Trecho de A poeira das manifestações, artigo de Mauricio Puls  

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