Por que não babo o ovo para o modelo tradicional de família?

“Deus tava entediado, fez um curso de cerâmica e resolveu moldar um boneco. Soprou e deu-lhe vida. Vê que bafo da gota. Aí Adão entediado exigiu uma companheira. Vê a carência. Deus arrancou uma costela dele e, PAM!, Eva na área. Viviam eles com os bichinhos, sem trabalhar nem bater um prego num sabonete Dove molhado (ninguém reclama que o governo sustentava, né?), no maior paraíso. Só não podiam comer uma fruta que Deus proibiu, era dele. Vê a proteção de privilégios exclusivos.
Aí Adão e Eva, depois de usarem alguma ervinha mais aditiva, bateram um papo com uma cobra e resolveram desobedecer. Foram lá e mandaram a fruta pro bucho. Adão botou a culpa em Eva, que o havia seduzido, como se ele não fosse maior de idade. Vê o machismo, a criancice e a falta de responsabilidade em assumir os erros. Deus deu piti e expulsou eles do bem-bom. Viraram sem-teto por causa de uma fruta roubada. Vê a crueldade. A família perder hospedagem e ajuda de custo porque fez um ato que qualquer maloqueiro faz. No máximo, uma pena alternativa de replantar árvores.
Mas Adão e Eva tiveram de começar a ralar e ralar e rolar pra botar menino no mundo. Tiveram dois pirraias. Abel era todo limpinho, comportadinho, santinho, roupinha transada, cabelinho escovado e recebia os elogios. Caim era mais sapeca, desajustado, malamanhado e sobravam as lapadas pra ele. Ou seja, o mais rebelde, problemático, que deveria ter acompanhamento e mais atenção, era desprezado. O mais equilibrado era posto nas alturas, ganhava os afagos, o preferido até de Deus. Vê a meritocracia. Tinha de dar em merda. Caim, putinho com toda aquela babação com o irmão, foi lá e o matou. Resultado: condenado a vagar pela Terra sem eira nem beira, acabou arranjando uma mulher pra casar (sabe-se lá de onde ela veio. Num só tinha Adão e Eva? Vê a falha de continuidade da produção).
Aí vêm dizer que a família acima é o primórdio da tradicional. Pai e mãe fumaram um, alopraram, seguiram os conselhos de uma cobra falante e deram um vaitefudê no cara que lhes proporcionava casa, comida, jardim de inverno e vista pro mar. Vê a doidice. Criaram os filhos na base da diferenciação, sem ajudar nas angústias e nos anseios do mais problemático, que terminou matando o outro e fugiu de casa atormentado. Segundo consta, a humanidade inteira vive em sofrimento por causa das cagadas do casalzinho inicial. Vê o fracasso.
Melhor seria Adão e Ivo. Tinham adotado umas crianças, tavam todas bem vestidas, belos sapatos, o mundo seria bem melhor decorado e com melhores cortes de cabelo. Não faltariam festa lacrativa e Baphão. Sem falar nas baixíssimas taxas de desemprego. Todos teriam trabalho garantido na Chilli Beans.”

Do Facebook de Miguel Rios

1 Comentário para “Por que não babo o ovo para o modelo tradicional de família?”

  1. Elaine disse:

    Lúcido e divertidíssimo! De pois do 2º “Vê a(o)…” do texto passei a esperar os próximos rs…

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